O que se pode aprender com os entregadores de almoço de Mumbai, Índia

O que se pode aprender com os entregadores de almoço de Mumbai, Índia

Em Mumbai, na índia, existe uma maneira interessante e peculiar de serviço de entrega de refeições. Milhares de entregadores cruzam a cidade todos os dias carregando encomendas e fazendo-as chegar às mãos de quem fez os pedidos. São os chamados dabbawalas.

Em híndi, uma das línguas mais faladas da Índia, dabba quer dizer caixa ou recipiente. Wala, por sua vez, é um sufixo como “-eiro” em português, que tem como significado formar uma profissão, como em pedreiro, marceneiro etc. Portanto, dabbawala quer dizer “aquele que carrega uma caixa”.

O serviço teve início em 1890, quando um banqueiro Parsi (um dos inúmeros grupos étnicos da Índia) contratou um funcionário para trazer comida caseira para o trabalho. Aos poucos, o sistema evoluiu para o que é conhecido hoje.

Os dabbawalas estão organizados em uma cooperativa na qual todos são tratados como iguais e como sócios. Não há diferenciação de salários (cada pessoa ganha em torno de R$ 160,00 por mês) e todo o lucro arrecadado é distribuído igualmente.

dabbawala2A estrutura hierárquica é bastante simples, existindo apenas três níveis: entregadores, líderes e administração. Cada grupo de 20 dabbawalas tem um líder e um trabalhador extra, que além de fazer o serviço como todos os outros, faz o trabalho daqueles que faltarem.

Cerca de 85% dos funcionários são analfabetos e, por este motivo, um sistema simples de cores e letras é utilizado para identificar as refeições. Existe também um alto nível de cooperação, não havendo rixas ou competição entre os grupos. As refeições são transportadas por diversas pessoas e compartilhada por cada grupo. Desde o início das atividades da cooperativa, não houve registro de nenhuma greve.

Os dabbawalas têm autonomia para tomar decisões na linha de frente, sem necessidade de formalidades. Eles aprendem também a entender como graves as implicações de seus erros, como atrasos ou pedidos errados para vegetarianos. Todos se tornam responsáveis por um bom serviço porque se o faturamento diminuir, a comunidade inteira será afetada. Portanto, mesmo em condições adversas, como na época das monções, quando chove muito na Índia, as entregas são feitas sem atrasos. A eficiência é extremamente valorizada, tendo-se uma acuracidade impressionante: um erro em seis milhões, o que é 99,999999% de acerto!

dabbawala4Existe um apreço tão grande pela eficiência que os clientes ruins e não confiáveis são abandonados para que não ponham em risco o sistema como um todo. Quando um dabbawala bate a porta do cliente, ele deverá estar pronto para receber seu pedido. São dados dois a três dias para que ele se ajuste ao sistema de entrega, caso contrário, o serviço é interrompido.

Os funcionários devem seguir regras, como, por exemplo, tratar bem seus clientes e usar chapéus indianos. Aqueles que não obedecem recebem advertências e podem ser expulsos caso o comportamento não mude. A disciplina é considerada um dos fatores de sucesso da cooperativa. Além disso, são feitas reuniões mensais para discutir problemas e questões relativas ao trabalho e também eventos de confraternização.

Mais de 200.000 refeições são entregues todos os dias pontualmente por 5.000 dabbawalas que utilizam bicicletas, carrinhos de mão ou trens para fazer o transporte. Ou seja, eles utilizam a infra-estrutura existente para realizar suas entregas sem necessidade de investimentos, atendendo uma área de 70km.

O preço de cada refeição é uniforme, independentemente da distância ou do peso e não há qualquer tipo de propaganda ou estratégia de marketing, apenas boca-a-boca. O custo operacional mensal da empresa inteira é de apenas R$ 8,00 e o faturamento anual da cooperativa gira em torno de R$ 9,6 milhões!

dabbawala3Até o príncipe Charles resolveu conhecer de perto os dabbawalas em 2003. O encontro foi realizado em uma estação de trem e durou apenas 20 minutos. Os trabalhadores não podiam se alongar mais do que isso porque a entrega das refeições não poderia sofrer qualquer tipo de atraso. Charles se impressionou principalmente com o fato de não haver qualquer tipo de tecnologia envolvida no processo.

Em resumo, pode-se aprender muito com os dabbawalas, sendo que uma das principais lições é que se pode ser extremamente eficiente atendendo bem seus clientes, não sendo necessário para isso nenhum sistema complicado ou grandes investimentos em tecnologia.

Lições dos dabbawalas

Pequenas, médias e grandes empresas podem se espelhar no exemplo dos dabbawalas para melhorar suas operações. Abaixo listamos 12 lições ensinadas por eles:

1) Mantenha o custo operacional e o investimento em capital no mínimo;

2) Atenda o seu cliente da melhor forma possível, procurando encantá-lo, sem atrasos ou erros;

3) Tenha um sistema simples e prático;

4) Especialize-se no seu negócio central e faça o seu melhor;

5) Tenha uma organização horizontal, com poder de decisão na linha de frente e na qual todos são sócios;

6) Faça com que todos cooperem entre si, tenham comprometimento com o negócio  e não criem um clima de competição interna. Resolva as diferenças de forma amigável;

7) Mantenha trabalhadores extras para que faltas sejam toleráveis;

8) Saiba quais são as implicações de um erro;

9) Penalize funcionários que não respeitam as regras;

10) Mantenha seus funcionários motivados e unidos;

11) Seja humilde e não se vanglorie do seu sucesso;

12) Abandone clientes ruins. Eles afetam a rentabilidade e o atendimento dos demais clientes.

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Para saber mais 

– Acesse o site oficial: http://www.mydabbawala.com

 – Veja alguns vídeos no You Tube:

    Vídeo 1

    Vídeo 2

– Leia reportagens:

    Reportagem da Economist (em inglês)

    Reportagem da Exame

    Reportagem Rediff (em inglês)

Sobre o Autor

Antonio Pedro Alves é formado em administração pela FGV, com MBA em Marketing pela FIA-USP, além de diversas especializações, inclusive na HEC, na França. Atuou em diversas multinacionais, tanto na indústria quanto no varejo, entre elas o Grupo Pão de Açúcar, Wal-Mart e Reckitt Benckiser. É executivo de marketing, palestrante e consultor.

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