Uma nova onda de inovação é necessária em restaurantes japoneses

Uma nova onda de inovação é necessária em restaurantes japoneses

Comer sushi ou sashimi em São Paulo ou em outras cidades pelo Brasil já se tornou um hábito bastante difundido e apreciado, o que fez com que a quantidade de restaurantes japoneses se multiplicasse. O que antes era uma refeição cara e sofisticada ou restrita aos descendentes, passou a ser difundida em larga escala, principalmente após o surgimento dos rodízios e dos combinados, invenções brasileiras que não são encontradas no Japão.

 japao5 Com o tempo, a culinária japonesa começou a ficar tão difundida que, segundo o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de São Paulo (SINHORES-SP), em 2003 havia mais restaurantes japoneses do que churrascarias na capital paulista. Em paralelo, também começaram a surgir diversas franquias de comida rápida, principalmente baseadas no temaki, as chamadas temakerias. O curioso é que este prato não é tão difundido no Japão quanto o é no Brasil, não existindo na terra dos samurais estabelecimentos especializados somente nele. É possível, no entanto, encontrar restaurantes no Japão que sirvam apenas pratos baseados no karê (curry japonês) ou que vendam apenas o shabu-shabu (prato no qual são cozidas verduras e carnes em uma panela na própria mesa), por exemplo.

 Para se adaptar às condições encontradas no Brasil e para agradar ao paladar dos brasileiros, os imigrantes japoneses fizeram diversas modificações na culinária. Segundo Jo Takahashi, da Fundação Japão, em sua entrevista para Revista Gula em maio de 2008, houve mudanças significativas:

 “A primeira providência foi plantar para tentar produzir alimentos similares aos que estavam habituados. O arroz que havia no Brasil era bem diferente, mas dava para fazer os bolinhos. Porém, não se encontravam algas para enrolar o sushi. Então, eles experimentaram diferentes folhas. Acabaram se adaptando melhor à de mostarda, que, aliás, costuma ser usada ainda hoje. Esse é um exemplo da culinária nipo-brasileira. Houve diversas tentativas de fermentar feijão e soja para produzir shoyu, que não deram certo. O miso também chegou a ser improvisado com melaço e milho, transformado numa espécie de xarope.”

Além destas mudanças, os imigrantes japoneses usaram peixes brasileiros, como o pintado e o dourado, na falta dos encontrados no Japão. E para fazer doces, precisaram substituir o feijão azuki, variedade da leguminosa que não era encontrada por aqui, pela batata doce.

Os brasileiros também introduziram inovações como o uramaki califórnia, trazido dos EUA e que, a princípio, era feito com abacate e que posteriormente foi substituído por frutas -principalmente a manga. Além disso, passaram a colocar maionese e cream cheese nos sushis, o que não era feito no Japão.

Na tabela abaixo podemos ver as ondas de desenvolvimento da culinária japonesa no Brasil:

Década

Acontecimentos

1908 – 1970

Adaptação dos pratos japoneses às condições encontradas no Brasil.

1970 – 1980

Primeiros restaurantes são inaugurados, principalmente no bairro da Liberdade, em São Paulo

1990 – 2000

Proliferação dos rodízios, surgimento das temakerias e de franquias de comida rápida, rápido crescimento da quantidade de restaurantes

Mais recentemente, a preocupação em realizar refeições mais saudáveis e leves contribuíram para aumentar a clientela dos restaurantes japoneses e ajudaram a aumentar a quantidade de opções disponíveis, tornando-se uma febre, principalmente entre os mais jovens.

Em resumo, a culinária japonesa sofreu diversas alterações desde o momento que chegou ao Brasil, não somente para se adaptar ao paladar e aos gostos do público local, mas também pela falta dos ingredientes que eram utilizados no Japão. Houve ondas de desenvolvimento da culinária que aos poucos foram ganhando diversos fãs por todo o país.

Nova onda de inovação

Apesar de um crescente interesse e aceitação por parte dos clientes, os restaurantes japoneses enfrentam hoje um novo dilema: como se diferenciar dos concorrentes? Como a quantidade de estabelecimentos aumentou muito nos últimos anos e a grande maioria adotou um esquema muito parecido, uma nova onda de inovação pode ser a solução para conseguir mais vendas e lucros.

Muitas inovações, que seriam inviáveis nas décadas de 1980 e 1990, hoje se tornaram possíveis de serem implantadas e testadas porque o mercado está muito mais preparado e receptivo para a culinária japonesa. Os clientes estão mais interessados e procuram novidades que os surpreendam. Um exemplo disso foi o surgimento, no bairro da Liberdade na cidade de São Paulo, da marca de sorvetes coreana Melona. De uma hora para outra começaram a ser vendidos picolés, principalmente no sabor melão, vindos diretamente da Coréia. Aos poucos a marca foi se espalhando pela cidade e hoje já vende 400 sorvetes por semana.

Portanto, inovar neste mercado pode trazer bons resultados e garantir um diferencial importante versus a concorrência. Abaixo estão algumas dicas por onde começar para vender mais:

1) Divulgação e explicação da cultura japonesa

Uma forma de se diferenciar dos concorrentes pode ser feita divulgando-se a cultura japonesa:

maneki_neko– Seria interessante, por exemplo, contar a história do Maneki Neko, o gato da sorte ou das boas vindas, que, segundo a tradição, deve estar presente em qualquer estabelecimento comercial para trazer mais clientes (se a pata esquerda estiver levantada) ou mais riqueza (se a pata direita estiver levantada). Leia mais no Blog Nipocultura.

– Algumas palavras utilizadas durante a refeição poderiam ser ensinadas aos clientes, como kampai (um brinde ou saúde) ou itadakimas (signfica “vou me servir”, o que deve ser dito antes de se comer a refeição).

– Seria interessante também ensinar aos clientes que algumas palavras japonesas têm origem no português. Como os portugueses por muito tempo foram o único povo que podia comercializar com o Japão, houve um intercâmbio grande entre as duas culturas e a introdução de produtos vindos do ocidente, o que se refletiu na língua. Veja no quadro abaixo algumas palavras japonesas com origem do português:

Português

Japonês

Carta

Karuta

Churrasco

Shurasuko

Confeito

Kompeito

Irmão

Iruman

Padre

Bateren

Pão

Pan

Vidro

Biidoro

Fonte: Wikipedia

2) Vitrine com réplicas em cera

É algo bastante comum passear pelas ruas de Tóquio ou Osaka e, antes de entrar em um lugar para almoçar, olhar na vitrine as réplicas em cera dos pratos servidos. Trata-se de uma forma prática e rápida de se mostrar ao cliente os tipos de comida que são a especialidade da casa, seus preços e sua apresentação.

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Réplicas de cera num restaurante em Tóquio

3) Pratos diferentes

Ao invés de somente vender sushis e sashimis, os restaurantes japoneses no Brasil poderiam explorar diversos outros pratos, como o shabu shabu – prato no qual carnes e verduras são cozinhados numa panela com água fervente – ou o sukiyaki – carnes, legumes, macarrão, entre outros, assados em uma panela.

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Shabu Shabu

Outra opção seria criar menus de degustação nos quais o cliente poderia saborear iguarias diferentes experimentando um pouco de cada uma delas. No Japão, é comum pedir refeições que venham com pratos variados: arroz, sopa, sashimi, sushi, entre outros.

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Comidas variadas em restaurante em Kyoto

4) Sobremesas típicas

É bastante raro encontrar sobremesas típicas japonesas nos restaurantes no Brasil. Acaba-se encontrando apenas versões nacionais como creme de papaia ou doce de leite. Algumas sobremesas japonesas são bastante saborosas e podem agregar um diferencial importante: sorvete de chá verde, doce de feijão azuki, anmitsu (feijão azuki, sorvete, salada de frutas e gelatina), wagashi (confeitos), entre diversas outras.

5) Ambiente diferente

O ambiente do restaurante também pode ser diferente do usual para chamar a atenção dos clientes. No Japão, existem estabelecimentos que possuem enormes tanques com água que ficam no meio do ambiente, no qual podem ser vistos peixes e crustáceos que serão consumidos nas refeições. Em outros, sushis e sashimis são feitos na hora depois de se escolher o peixe mais bonito do aquário (mais fresco que isso, impossível).

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Sushi feito com peixe do aquário

Em resumo, os restaurantes japoneses devem se preparar para uma nova onda de inovação para poderem sair da mesmice em que se encontram hoje. Deverão olhar seu negócio dentro de um espectro amplo, analisando o ambiente, atendimento, cardápio e decoração, somente para citar alguns exemplos. Quem primeiro compreender a necessidade desta nova onda de inovação sairá na frente. Banzai!

*todas as fotos são da minha viagem para o Japão em 2007

Leia Mais

Entrevista – Made in Japan

Entrevista – Revista Gula

Matéria do Último Segundo

Nipocultura

Site Japão Brasil

Site Fundação Japão

Wikipedia – Cozinha Japonesa (em inglês)

Wikipedia – Origem de Palavras Japonesas do Português

 Sobre o Autor

Antonio Pedro Alves é formado em administração pela FGV, com MBA em Marketing pela FIA-USP, além de diversas especializações, inclusive na HEC, na França. Atuou em diversas multinacionais, na venda direta, na indústria e no varejo, entre elas o Grupo Pão de Açúcar, Wal-Mart, Reckitt Benckiser e Avon. É executivo de marketing, palestrante e consultor.

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