O processo de evolução dos canais de distribuição no Brasil: benefícios ou problemas para os fabricantes?

O processo de evolução dos canais de distribuição no Brasil: benefícios ou problemas para os fabricantes?

Por Prof. Dr. Francisco Alvarez, professor da USP, FIA-USP, IBMEC e FAAP. Sócio fundador da Trade Marketing Assessoria (http://www.trademarketing.com.br). Publicado originalmente em 17/05/2005.

Os canais de distribuição no Brasil têm evoluído a passos largos desde a década de 1990, com as fusões que formaram grandes redes, a chegada de grandes grupos internacionais, a conseqüente melhoria nos processos de gestão e o desenvolvimento de novos modelos de negócio e de pontos-de-venda muito mais atrativos.

Seria natural que essa evolução gerasse benefícios para os fabricantes, uma vez que eles têm à sua disposição pontos de distribuição mais interessantes e bem gerenciados, que oferecem maior variedade. Mas a realidade é que, se de um lado esses benefícios têm ocorrido, de outro as grandes redes que passaram a concentrar cada vez mais poder, tanto do ponto de vista econômico como no de imagem, se tornaram um obstáculo à indústria, que agora tem de lidar com a imposição de normas para poder expor seus produtos ao consumidor final.

Em geral os distintos canais têm sido dominados pelas seguintes grandes redes:

No canal de auto-serviço: o grupo CBD (Companhia Brasileira de Distribuição, formada pelas marcas Extra, Pão de Açúcar e CompreBem) é líder e detém aproximadamente 17% do setor; ele vendeu 50% de seu capital para o Francês Casino. O Carrefour, que é o segundo colocado e detém aproximadamente 14% do setor, é de origem francesa. O norte-americano Wal-Mart, maior empresa mundial por faturamento, começou a atuar no Brasil em meados da década de 1990 de maneira tímida; com a recente aquisição do grupo Bom Preço, do Nordeste,  já é a terceira rede brasileira. O quarto colocado é o grupo Sonae, de origem portuguesa, que atua predominantemente no Rio Grande do Sul e no Paraná. Somente o quinto colocado ainda se mantém com capital totalmente nacional: é o grupo Zaffari, do Rio Grande do Sul. Essas cinco redes são responsáveis por um volume de 42% das vendas do setor.

No canal de eletroeletrônicos: o fenômeno Casas Bahia, com seu faturamento superior a 7 bilhões de reais, representa mais que o dobro do segundo colocado, a rede Ponto Frio. Em seguida, temos a Rede Colombo, do Sul do Brasil, e o Magazine Luiza, que estão muito próximos em faturamento e representam por volta de 20% do faturamento total dos líderes. Juntas, essas redes – que, ao contrário do setor de auto-serviço, são de capital nacional – representam aproximadamente 35% do setor.

cestinha_lojaEsse mesmo movimento pode ser observado no setor farmacêutico, com presença cada vez maior de grandes redes e já com a participação de um grupo chileno que adquiriu a Drogamed, e no setor de material de construção, com a competição cada vez maior entre home centers – conceito que foi trazido pela rede francesa Leroy Merlin em meados da década de 1990 e que vem aumentando sua participação de mercado. Algo semelhante ocorre no setor de livros, com a difusão das megastores que exercem forte atratividade sobre os consumidores, e a presença da rede francesa FNAC e de alguns investidores espanhóis.

Diante desse cenário, sob o ponto de vista da gestão de canais de distribuição, os fabricantes podem ser divididos em dois segmentos: os que trabalham no canal independente e têm de se submeter ao poder das grandes redes, e os que trabalham no canal administrado e ainda detêm o poder sobre o canal de venda.

Os que trabalham no canal independente têm mudado sua gestão de distribuição e sua estratégia de marketing e de produtos. Isso porque a pressão exercida os obriga a desenvolver políticas específicas para determinados canais e clientes, o que os faz atuar de maneira diferenciada com os clientes, em função de seu perfil e de suas demandas. As principais preocupações passaram a ser a ocupação de espaço no ponto-de-venda, a abertura de novos canais (como venda direta), a expansão geográfica e novas parcerias com as grandes redes. O cuidado em evitar o conflito de canais se tornou constante, uma vez que as redes estão sempre prontas a desenvolver os produtos ou fazer exigências ao se sentirem prejudicadas. Novas formas de organização têm sido criadas para fazer frente a essa situação, e as funções de trade marketing e gerência de contas especiais estão se tornando cada vez mais freqüentes no segmento.

Já as empresas que administram sues canais, embora tenham problemas de velocidade de expansão e uma responsabilidade maior sobre o resultado do canal, estão encontrando um ambiente propício para seu desenvolvimento e para sua consolidação junto ao consumidor final. Esse modelo tem se beneficiado com a presença cada vez maior de shopping centers, os quais tiveram início no Brasil em 1966 com a inauguração do Shopping Iguatemi, em São Paulo, e que num primeiro momento tinham o foco voltado exclusivamente para um público de alto poder aquisitivo, e que chegaram a 2004 com cerca de 290 empreendimentos, de acordo com a Abrasce, e uma participação de 18% do varejo. Se num primeiro momento os shoppings centers tinham foco voltado exclusivamente para um público de alto poder aquisitivo, hoje eles atingem várias classes sociais – desde a classe C, com shoppings como o Santa Cruz e o Metrô Tatuapé, em São Paulo, que estão ligados às estações do metrô, até a classe A+, com shoppings como a Daslu, um templo de consumo para o público de altíssima renda, inaugurado em junho de 2005 em São Paulo.

De fato, os fabricantes que puderam utilizar a força de sua marca para montar sua própria rede enfrentaram problemas distintos, mas a situação se mantém favorável para sua expansão, já que o setor de shopping centers permanece em crescimento e o modelo de franquias atende ao espírito empreendedor do brasileiro, que continua a buscar novas oportunidades de negócio.

Basicamente a grande diferença entre esses dois modelos está no domínio da presença do fabricante junto ao consumidor final: os que trabalham com canal independente têm de negociar sua presença e visibilidade junto a esse consumidor com as empresas que dominam os canais. Já os que podem trabalhar com redes administradas têm a garantia de que sua política de marketing estará visível ao consumidor final.

Artigo elaborado para o livro “Administração de Marketing” de Philip Kotler e Kevin Keller, 12ª edição, editora Prentice Hall, 2005.

Sobre o Autor

Prof. Dr. Francisco J. S. M. Alvarez

Formação:
Doutor e Mestre em Administração de Marketing (USP). Pós-graduado em Business Administration, Central London Polythchnic, em Londres e Graduado em Ciências Econômicas.

Atividades docente:
Professor do curso de graduação em Marketing da USP, dos cursos de MBA do da FIA-USP, do IBMEC e da FAAP em São Paulo.

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